Em menos de 15 dias de visitação, a exposição “Raízes: Começo, Meio e Começo” já recebeu 6,5 mil visitantes no Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab), no Centro Histórico de Salvador. Com mais de 200 obras de 80 artistas negros, como Emanoel Araújo, Heitor dos Prazeres, Lita Cerqueira e Juarez Paraíso, a mostra aberta na última sexta-feira (19) tem atraído pessoas de diferentes idades e lugares.
Amigas de profissão, a norte-americana Alex Rodriguez, de 28 anos, e a britânica Sophia Anderson, 31, que são professoras de Inglês na Colômbia, estiveram no equipamento para conhecer um pouco mais da cultura local. “Ontem estivemos em uma apresentação do Balé Folclórico da Bahia, gostamos muito. Hoje, pesquisamos por museus e retornamos à região para conhecer um pouco mais da história e cultura daqui”, contou Sophia.
Próximo a elas, o advogado Cleber Santos, de 41 anos, observava atento cada obra de arte ao lado da esposa e do filho. “A exposição está muito bonita e é uma oportunidade de visitar a nossa história, enquanto povo negro. Achei bacana essa concepção. O baobá foi um dos elementos cênicos que mais chamaram a minha atenção, pois ele simboliza a longevidade e a vida e é ele quem abre a exposição”, opinou.
A mostra segue aberta até 9 de março de 2025, de terça a domingo, das 10h às 17h, com acesso até as 16h30. O equipamento fica na Rua das Vassouras, 25, no Centro Histórico, e os ingressos custam R$20 (inteira) e R$10 (meia), com gratuidade às quartas-feiras. A exposição enaltece as tecnologias das matrizes africanas que moldaram a construção identitária do Brasil e propõe a circularidade do tempo, a conexão do presente e do futuro com os antepassados.
Acervo – Com curadoria de Jamile Coelho e Jil Soares, a exposição é dividida em cinco eixos temáticos: Origens, Sagrado, Ruas, Afrofuturismo e Bembé do Mercado. O núcleo “Origens” parte do princípio de tudo. Salvador é descrita como o útero da raça negra na diáspora. Já o território “Sagrado” aprofunda as tradições espirituais. Mesmo dispersas, elas foram capazes de reatualizar e ritualizar suas conexões existenciais de pertencimento, por meio do culto aos orixás, nkisis e voduns juntados aos caboclos encantados da terra.
O espaço “Ruas” abraça o “pretuguês,” neologismo que define o simbólico universo linguístico, artístico, gastronômico, político, social e cultural enraizado nas matrizes africanas. Nesse espaço, a curadoria trouxe obras de artistas contemporâneos e conhecidos pela realização de obras populares e emblemáticas da rua. No local, é possível ver peças de Jaime Figura, Marcos Costa (Cabuloso) e do artista visual e professor Mário Vasconcelos, além das fotografias de Alex Oliveira, com o seu projeto Foto Performance Popular, e de Rafael Rodrigues. “O museu pertence à rua também e a rua é o museu”, conta Jil.
O ambiente “Afroturismo” promove o encontro entre ficção científica, tecnologia, realismo fantástico e mitologia para retratar a vida plena da população negra nas artes visuais e na moda. E “Bembé do Mercado” registra os patrimônios culturais imateriais expressos na musicalidade, na língua, nos versos, nos sotaques e nos saberes sociais.
“Toda essa engenharia visual é uma herança que nos chega através da náutica do devir. Como um retorno político à cidade, convidamos o visitante a refletir sobre a diáspora afro-ameríndia e sobre a continuidade das tradições ancestrais, transformando a experiência visual em um testemunho vivo do passado e um vislumbre do futuro”, avaliou Soares.
Centro Histórico – Presente na exposição, o jornalista, escritor, poeta e agitador cultural Clarindo Silva, que desfilou no equipamento na semana passada, contou que fica muito emocionado ao ver o Muncab funcionando como ponto de exposições artísticas dentro do Centro Histórico. “Eu fui uma das pessoas que, juntamente com Capinam, Maria Augusta e Jaime Sodré, fiz uma visita a esse espaço quando ainda estava em ruínas. Hoje estamos podendo desfrutar desse espaço, que foi restaurado com muito suor e com muita determinação. Eu acho que nós estamos precisando fazer exatamente o que está se fazendo: reescrever a história desse país por meio do investimento em saúde, educação e arte”, opinou.
Jornalista e filho do historiador Luís Henrique Dias Tavares, Luís Guilherme Tavares também destacou a importância de um equipamento artístico como o Muncab no Centro Histórico de Salvador, enquanto apreciava a exposição. “Eu manifesto a minha profunda gratidão pela iniciativa. Nós não tínhamos uma alternativa, além do Museu de Arte Moderna e do Palacete das Artes e agora nós temos o Muncab no centro da cidade. Ter isso no Centro Histórico da cidade é um diferencial absolutamente fantástico, sobretudo para atrair o soteropolitano para cá. Afora compensar a visita de estrangeiros e brasileiros que chegam aqui e se concentram no Centro Antigo de Salvador”.
Após obras de revitalização que contaram com investimentos da Prefeitura de Salvador, o Muncab foi reaberto em novembro com a exposição “Um Defeito de Cor”, com base no livro homônimo de Ana Maria Gonçalves e, em seguida, foi palco da mostra “Reverberações – Refletindo a impressão da memória africana”, com fotografia do artista visual nigeriano Mudi Yahaya – juntas, receberam, mais de 135 mil visitantes.